Por Renat Nureyev*
Certamente você já ouviu falar em uberização em algum momento da sua vida. Mas o que é isso? Vamos tentar explicar esse atual fenômeno social (fortemente presente em nosso cotidiano) a partir do texto "Trabalho Digital e Emprego: a reforma trabalhista e o aprofundamento da precariedade", dos sociólogos Jacob Carlos Lima e Maria Aparecida da Cruz Bridi.
Uberização é um conceito para definir um tipo específico de precarização do trabalho. Nem toda precarização é uberização, mas a uberização é seguramente uma modalidade de trabalho precário.
A uberização está inserida na dinâmica de um “capitalismo flexível”, com diferentes e flexíveis trabalhos, modalidades de contratação e de relações salariais. O designativo emerge a partir da UBER, uma empresa criada em 2010 e que se define como de tecnologia e não de transporte (LIMA; BRIDI, 2019).
Essa flexibilização aliada ao digital, que vem ganhando cada vez mais força na hodiernidade, prepara o terreno para que apareça o fenômeno da uberização. Com o desenvolvimento de aplicativos (típicos do mundo digital), surge a chamada “economia do compartilhamento” ou de “plataforma” (LIMA; BRIDI, 2019).
Para os professores Jacob Carlos Lima e Maria Aparecida Bridi (2019, p. 335),
“essa economia coloca em contato demandantes de serviços, como, por exemplo, caronas, carros, espaços para alugar, entregas variadas, e que permitem ganhar dinheiro. A empresa virtual disponibiliza o app a partir de uma taxa determinada e, a partir daí, junta o prestador de serviço com o demandante desse mesmo serviço”.
A uberização é a situação típica ideal dessa economia de plataforma. Ela pode ser definida como a relação de trabalho contemporânea em que se vende um serviço para alguém de forma independente por meio de um aplicativo, sem intermediação de empresas e sem vínculos trabalhistas entre o prestador do serviço e o dono do aplicativo, disfarçando, através de uma indeterminação estratégica, a relação de emprego (LIMA; BRIDI, 2019).
Ou seja,
“na uberização, o trabalhador é um empreendedor de si, vinculado e subordinado a um app que liga prestadores de serviço a consumidores, intermediados por uma empresa que fica com uma porcentagem do apurado” (LIMA; BRIDI, 2019, p. 335).
A ideologia do empreendedorismo, que romantiza essa situação de trabalho, oculta, através de discursos convincentes, essas condições trabalhistas precárias, permanecendo os problemas sociais, tais como o não reconhecimento dessa atividade como um trabalho formal e a ausência de proteção sócio-jurídica para os trabalhadores que utilizam o aplicativo para fins de trabalho e sustento.
“A concorrência da UBER tem desestruturado os serviços regulares de táxi e provocado revolta e mobilizações entre os taxistas, uma categoria de trabalhadores que, até pouco tempo, mantinha grande controle sobre seus mercados de trabalho através de compra de licenças, negociação dessas licenças com as prefeituras, determinando monopólios de atendimento a determinados espaços das cidades, o acesso a pontos, etc. Tal situação vem encolhendo com a concorrência das plataformas incidindo diretamente sobre os ganhos diários desses trabalhadores e no preço dessas licenças” (LIMA; BRIDI, 2019, p. 335-336).
É interessante apontarmos que, atualmente, o número de motoristas cresce vertiginosamente na UBER, guardando forte relação com o desemprego no país. Afinal, todos os dias trabalhadores desempregados que não conseguem ocupação fixa tendem a entrar para o segmento (LIMA; BRIDI, 2019); além daqueles que, em seus horários livres, usam a atividade intermediada pelo aplicativo para complementar a renda.
Por fim, vale lembrarmos que a uberização não se restringe somente ao ramo do transporte, mas está presente em várias outras atividades. A entrega de comida, cujo maior expoente é o ifood, é um excelente exemplo. A uberização chegou recentemente até mesmo nas classes dos professores (em Ribeirão Preto-SP) e dos Enfermeiros (na Inglaterra), demonstrando que a tendência é que este fenômeno social hodierno se amplie cada vez mais, estando continuamente presente na nossa vida em sociedade e alcançando vários outros segmentos em um futuro próximo.
Referência:
LIMA, Jacob Carlos; BRIDI, Maria Aparecida da Cruz. Trabalho Digital e Emprego: a reforma trabalhista e o aprofundamento da precariedade. In: Caderno CRH, v. 32, n. 86, 2019.
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* Professor do Colégio Tiradentes da Polícia Militar de Minas Gerais. Mestre em História Social pela Universidade Estadual de Montes Claros. Graduando em Direito pela Universidade do Estado de Minas Gerais.
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